domingo, 4 de janeiro de 2009

Fado

Os últimos posts têm sido dedicados à ligação – tão próxima e tão linda -, da música e da literatura. Tentar tocar os jovens demonstrando-lhes a afinidade entre músicos, intérpretes e escritores parece ao adrian, cada vez mais, uma extraordinária forma de promover o texto literário e consequente gosto pelo mesmo. Após ter referido exemplos de hip-hop, hard e punk rock, não falar de Fado seria quase crime de lesa-majestade. Assim, e aproveitando a presença, em 2008, de Camané no Festival Sudoeste, aqui fica uma dica: saberiam os jovens que o ouviram que escutaram, não só uma voz maior da Canção Nacional mas que, também, o seu timbre lhes trouxe, entre outros, os versos de David Mourão-Ferreira (Lembra-te sempre de mim) e de Pedro Homem de Mello (Sei de um rio)? E saberemos nós - os que lhes tentam incutir o gosto pela leitura e, neste caso particular, pela poesia -, qual a reacção desse público ao espectáculo? Leia-se, do Blitz:
“ Momentos depois de David Fonseca terminar o concerto, no palco Planeta Sudoeste já estava bastante gente a aguardar a chegada do fadista Camané . Se dúvidas existissem sobre a aceitação do fado num festival de Verão, rapidamente se dissiparam. Apesar de todo o rebuliço no exterior da tenda que acolhe o palco secundário, o silêncio solene para receber a música tradicional portuguesa fez-se sentir. "Sei de Um Rio", canção que apresenta Sempre de Mim - o mais recente e muito aplaudido álbum do cantor - dá início ao concerto. A timidez de Camané vai-se dissipando aos poucos e, entre gritos de "Ah fadista" e "És grande" - muito público verdadeiramente jovem a assistir - o cantor vai passando em revista fados mais gingões e outros carregados de sentimento fatalista. "Lembra-te Sempre de Mim", "Mais Um Fado no Fado" e "Fado Sagitário" foram recebidos com palmas (para marcar o ritmo ou simplesmente para agradecer a entrega do cantor). Depois de apresentar os músicos que o acompanham, chama ao palco um convidado muito especial: o contrabaixista Carlos Bica ajuda-o em "Este Silêncio". Fado no Sudoeste? Aposta ganha!”
Os versos de algumas das canções do alinhamento desse espectáculo aqui ficam. Com tempo, revelar-se-ão outras ligações entre estas novas vozes do Fado e escritores nacionais (Mariza, Ana Moura, Mafalda Arnauth, Pessoa, Cesarinny, Ary dos Santos). A posologia, já sabem, é a habitual ;-)
Sei de Um Rio

Pedro Homem de Mello
(Alain Oulman)

Sei de um rio…
Sei de um rio
Em que as únicas estrelas
Nele, sempre debruçadas
São as luzes da cidade

Sei de um rio…
Sei de um rio
Rio onde a própria mentira
Tem o sabor da verdade
Sei de um rio

Meu amor, dá-me os teus lábios!
Dá-me os lábios desse rio
Que nasceu na minha sede!
Mas o sonho continua…

E a minha boca (até quando?)
Ao separar-se da tua
Vai repetindo e lembrando
“– Sei de um rio…
Sei de um rio…”

Sei de um rio…
Ai!
Até quando?
Lembra-te Sempre de Mim

David Mourão-Ferreira
(José Mário Branco)

Se alguém pedir a teu lado.
Que na música de um fado
A noite não tenha fim
– lembra-te logo de mim!

Se o passado
De repente
Mais presente
Que o presente
Te falar também assim
– lembra-te logo de mim!

Se a chuva no teu telhado
Repetir o mesmo fado
E a noite não tiver fim
– lembra-te sempre de mim!
Lembra-te sempre de mim!

O dia não tem sentido
Quando estás longe de mim...
Se o dia não tem sentido
Que a noite não tenha fim!
foto aqui

2 comentários:

Luísa Alvim disse...

Votos de um ano bom para ti e obrigada pela partilha sobre o projecto KIVA.

Gaspar Matos disse...

Um bom ano para ti também, Luísa. Irei dar mais umas boas novas sobre o Kiva no decorrer de 2009.
Um abraço!